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Acerca de mim

Jornalismo U.F.Bahia/ Filosofia U.N.Lisboa/ Campeã Brasileira de Vela(Laser)/Nasci no Brasil(Bahia). Morei em Salvador, São Paulo, Cambridge, Ibiza e Lisboa.Autora de"O Caminho do Mar", Ilustração: Calasans Neto, ed.P555, Salvador-Ba,2004. Tenho três gatos:Homero, Bocage e Clarice(Lispector). Signo de Touro, ascendente em Leão, lua em Peixes.Doze e meio por cento de Sangue Índio(BR), a melhor parte de mim.

sexta-feira, junho 01, 2007

ANTROPOFAGIA TROPICAL

III

Lá fora o espaço aéreo estava composto por nuvens cortadas por andorinhas em revoada, o vento soprava alto com orgulho nímbico a anunciar a possibilidade de chuva próxima. O sol se opunha a lua, que embora frágil, permanecia na abóbada ao meio-dia, numa confluência de fenómenos perceptíveis ao olho humano, embora naquele momento só ele se encontrasse voltado para o cenário, mas alheio a este, pois que absorvido pela trama dos acontecimentos. Ela notara a confluência de imagens a que ele sujeitara-se e desajeitadamente sentiu-se no centro do universo, enquanto ele dava passos lentos, estudados, calculando a distância na proximidade material aflitivamente indisponível. Encontrava conscientemente o canto em que pudesse afastar-se para sofrer a atracção em novo ângulo e suspeitou da possibilidade de alguma macumba. Felicitou o próprio destino e esboçou um sorriso de Alexandre, o Grande. O silêncio dominava as testemunhas imunes ao acontecimento destinando-as à paisagem. A imaginação dela confluía com o interesse acrobata indiferente ao cansaço que forjava um único campo magnético que a ambos protegia. Doravante a vida ganharia uma nova textura a partir de uma tessitura que a quatro mãos conquistava o tempo oportuno das sensações variegadas, a revolver o mais próprio de cada um deles. Às vezes tinham que se olhar um ao outro, promovendo a cumplicidade no desconhecido e tudo se tornava explícito e aos poucos aprendiam a reverenciar o anunciado vencedor. As palestras sucederam-se com regularidade e esperar os esparsos momentos de tocarem-se com as retinas era a regra dos dias, escamoteando a sondante omnipotência em encontros aparentemente casuais. Facto que resvalava para regiões misteriosas da esfera entre o profano e o sagrado e os dotava de uma atmosfera em crescente poder que, ora assumia-se enquanto distinta, ora enquanto caótica. A comunicação pelo silêncio era mágica e a palavra começava a se estabelecer em fragmentos de espanto que partia do sensual e alcançava o filosófico. As personalidades ofereciam seus contornos e os primeiros passos para o conhecimento disparavam-se com teoria e divindade doadora de sentido, que sem conceito de fim, sem significado, se sustentavam no belo. A imaginação disparava na busca das formas fugidias sendo impossível estabelecer qualquer definição. E esta impotência da razão transformava-se em ternura exótica. Não se despediam, debandavam, não sem se espreitarem com o sistema nervoso em frequência desencadeante da acção. O desejo era de unidade, mas os receiosos passos contrariavam o alado e rechonchudo deus que manejava impunemente o seu arco e flecha.


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