Filosofia,literatura e outros...

Acerca de mim

Jornalismo U.F.Bahia/ Filosofia U.N.Lisboa/ Campeã Brasileira de Vela(Laser)/Nasci no Brasil(Bahia). Morei em Salvador, São Paulo, Cambridge, Ibiza e Lisboa.Autora de"O Caminho do Mar", Ilustração: Calasans Neto, ed.P555, Salvador-Ba,2004. Tenho três gatos:Homero, Bocage e Clarice(Lispector). Signo de Touro, ascendente em Leão, lua em Peixes.Doze e meio por cento de Sangue Índio(BR), a melhor parte de mim.

quarta-feira, junho 06, 2007

ANTROPOFAGIA TROPICAL

IV

Os dias passam a voar e os apaixonados em vésperas de si próprios nem sempre sabem fazer atrasar e moldar o tempo às suas disposições, pois entre o amor e a vida pode haver muito espaço e os contratempos têm arestas promotoras de outros atritos e nós que tomam proporções indesejáveis pela ausência, que deixam o toque fora das fracções do abraço, do beijo. Cada partida representava uma demora de sofrimento esgarçado, sem direito a despedida, enquanto fingiam, um ao outro, nada levar consigo de importante enquanto esparsos olhares traíam a mentira quase adolescente e pouco sustentável, no dobrar do lance de escadas que se enrolando para a esquerda ,ao modo de uma serpente, fugia de um destino que mete medo. Mais adiante olhou por um ângulo inferior em degraus obtendo sobre si paralela visão de pernas sob calças que avançavam sobre o presente. Recompondo a sobriedade terminava os degraus com passo lento, mostrando o pescoço tenso, a cabeça inclinada, pretendendo alcançar o nível do solo ainda que com determinada frustração prolongada. Ela examinava o que acontecia sem compreender a violência impregnante da distância, da força contrária ao óbvio, contrária a sua movimentação natural que a convidava a segui-lo, simplesmente caminhar ao lado dele, como se isto fosse lógico.
Restava a visão dos pardais cruzando o pátio em voos baixos a procura de farelos de bolos e esses chamavam-na a atenção perdida no vazio da perplexidade muda. Observava o alarido das crias em sua aprendizagem de autonomia. A responsabilidade educativa das mães pássaro era o único espectáculo possível, abstraindo-se de tudo o mais à sua volta, continuava a fixar-se nos pardais que se movimentavam sem a hesitação de comer ou levar no bico. Levar no bico a migalha encontrada, depois de tanto procurar na actividade semi-circular das cabeças, era o que se permitia os adultos que cuidavam ninhos, sendo imediatamente imitados pelas crias. A ansiedade encontrava um ancoradouro sólido e distribuía o cansaço inerente, trazendo o peso da iminente inquietação amalgamada em melancolia arrastada. Arrastada pela lentidão do tempo e socorrida pelas ideias estéticas que em letras de forma preenchem o papel sagrado na ânsia de concertar o momento disperso. A literatura encontra-se com a filosofia e na magia dos dedos obsessivos ao teclado, uma música se despeja em capítulos e o sentimento toma novas formas apertadas, como na contenção própria da arte dos bonsais.

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